


Por Karin Schmidt
"A vida inteira, desde criança, eu sempre quis viajar e conhecer mundo, mas achava que pra isso precisava ser rico ou milionário. Comecei a pesquisar e ver que não era tão caro, que existiam muitas maneiras de transformar sonhos em destinos. Isso com total segurança e pouco dinheiro".
Assim começa a história de Tadeu Salgado, 33 anos, e que, até o momento, já conhece 36 países. Ele fala inglês, mas garante e comprova que não é necessário dominar outros idiomas para conhecer o mundo.
Natural de Varginha (MG), há seis anos mora em Cerro Largo, onde trabalha como produtor cultural no campus local da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS).
Comecei a entrevista perguntando se na região das Missões existia algum atrativo turístico, jamais visto em todos os países que percorreu. Sua resposta foi positiva e surpreendente.
Tadeu é autor do livro Como sobreviver no exterior, feito em parceria com a escritora Simone Póvoa, que reside nos Estados Unidos. Lançado oficialmente em Brasília, no ano passado, a obra é um guia completo desde a decisão de viajar até o momento em que você decide voltar (se este momento chegar).
As dicas passam por escolha do local, documentação necessária, arrumação das malas, passagens, hospedagem, primeiros dias em terras estrangeiras, como se comunicar com o Brasil, como superar desafios que poderão surgir, o que fazer em casos de emergência, vantagens de viajar sozinho, entre outras preciosas e inusitadas orientações. Tem também um capítulo para àqueles que decidam por não voltar ao Brasil, ou que optam por ir em caráter semipermanente para passar muitos anos fora.
"Seja para quem quer mochilar, turistar ou ir morar no exterior, este livro é um manual imprescindível para que você faça as escolhas certas e aproveite ao máximo sua experiência, sem medo de se aventurar e sempre lembrando: independente de idade, viajar é um investimento pessoal em nosso bem estar e autoconhecimento", garante Salgado.
Sucesso em todo o país, o lançamento oficial do livro foi em novembro de 2017, na Livraria Cultura, e continua sendo um dos mais vendidos do Brasil, além de ter ficado em primeiro lugar de vendas no site Amazon.
Dono do canal Viajante Pão Duro, onde exibe vídeos com relatos e informações de suas viagens, Tadeu sempre faz questão de evidenciar Cerro Largo e a região das Missões em suas postagens. Inclusive, o ator Paulo Betti foi um dos divulgadores, em vídeo, do lançamento do livro em Cerro Largo, que também aconteceu em novembro de 2017.
Conversei com Tadeu na sede da UFFS de Cerro Largo, quando fui presenteada com um exemplar do livro. Mesmo antes de ler, fiquei bastante entusiasmada e encorajada a viajar pelo exterior, por causa da maneira simples e contagiante com que ele relata sobre dicas importantes, práticas e seguras. Na verdade, quanto mais eu perguntava, mais queria saber.
Muito obrigada, "Viajante Pão Duro", pela oportunidade enriquecedora de te conhecer. Todas as tuas dicas são relevantes, em especial, esta: “não espere se aposentar pra começar a viajar. Se organize, planeje e comece a se aventurar pelo mundo enquanto sua saúde está boa, pois a vida passa depressa.
Karin Schmidt - Há quanto tempo e como você veio parar em Cerro Largo?
Tadeu - Há 6 anos. Eu passei no concurso para produtor cultural aqui na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Descobri no último dia de inscrição, que tinha Cerro Largo e Erechim pra escolher. Pesquisei sobre a cidade e achei bem interessante. Sou natural de Varginha, já morei em Belo Horizonte, Niterói e Brasília e tinha vontade de mudar para um lugar mais sossegado, com mais qualidade de vida. Gosto de Cerro Largo porque aqui é tudo perto e muito tranquilo de se viver.
KS - O que te motivou a viajar pelo mundo?
Tadeu - A vida inteira, desde criança, eu sempre quis viajar. Mas eu achava que precisava ser rico, milionário pra viajar e conhecer o mundo. Daí comecei a pesquisar e ver que não era tão caro, que era só saber se planejar e se organizar. E logo descobri as companhias aéreas low cost (baixo custo), os hostels (albergues) e o couchsurfing (hospedagem sem custos na casa de outras pessoas). Tudo com a mais absoluta segurança.
KS - Quando você fez a sua primeira viagem internacional?
Tadeu - Em 2009. Na época eu era estudante de graduação em Produção Cultural na Universidade Federal Fluminense, em Niterói/RJ, e estagiário na Casa da Gávea, no Rio. Ganhava 300 reais por mês. Além do estágio, eu era assistente de produção do Ronald Teixeira, reconhecido diretor de arte e cenógrafo. Eu juntava todo meu salário sempre pensando em viajar. Quando eu estava com a quantia de 3.500 reais na conta, comprei uma passagem pra Paris.
KS - Por quanto tempo você ficou fora e como foi essa experiência?
Tadeu - Uns 20 dias. Fui à França, Inglaterra, Irlanda, Itália e Vaticano. Fiz tudo o que queria fazer e conheci todas as atrações turísticas que pretendia. Naquela época já sabia que se você planejar, pesquisar e estudar sobre o país, consegue fazer uma viagem aproveitando muito e gastando pouco. Voltei outra pessoa, com mais conhecimento, mais maduro, menos materialista, mais seguro em minhas atitudes e com minha autoestima mais elevada.
KS - Mas não precisa dominar outro idioma pra viajar sozinho pelo mundo?
Tadeu - Não. Se a pessoa souber somente o português, pode viajar tranquila, porque hoje em dia com o celular se faz quase tudo e por isso é muito fácil viajar para o exterior. Tem Google Maps, google tradutor e muitos aplicativos direcionados a quem está viajando. É só pesquisar antes sobre o local, costumes, cultura do país que se quer conhecer. Por exemplo, quando estive na Indonésia conversei com um cara sem nenhum de nós sabermos o idioma. Perguntei a ele sobre o valor do lugar que eu queria ir. Ele pegou a calculadora, digitou o valor, eu disse que estava muito caro, e ele foi baixando o preço até nos acertarmos. Tudo pelo celular e pela mímica.
KS - E quanto a hospedagem?
Tadeu - Uma opção excelente pra quem viaja com pouco dinheiro é utilizar o couchsurfing, que é uma ponte entre viajantes e anfitriões dispostos a conhecerem uma nova cultura. Você pode conseguir desde um colchão no chão, um sofá ou mesmo um quarto privado. Quando fui pra França, fiquei na casa de uma menina pelo couchsurfing, Trocamos mensagens antes, eu informei o período que estaria lá, e assim fiquei hospedado na casa dela. Isso tem no mundo inteiro.
KS - Mas isso é seguro?
Tadeu - Sim, porque se eu chegar lá e roubar, ou fizer algo errado, a pessoa que me hospedou coloca no meu perfil e não tem como apagar. Fica visível para todo mundo. Da mesma forma, acontece com quem oferecer a hospedagem. Conheço pessoas de diferentes países, que viajam o mundo todo pelo couchsurfing, e nunca vi comprovação de nada errado.
KS - E as despesas com alimentação?
Tadeu - Tem que evitar comer em área turística, onde tudo é mais caro. A dica é ir num restaurante e pedir o prato do dia, que é mais barato. Quando eu viajo fico em couchsurfing ou em albergue, que têm cozinha, daí é só comprar as coisas no supermercado que fica mais em conta.
KS - Mas têm países onde você se hospedou em hotéis 5 estrelas?
Tadeu - Ah tem. Quando vou para os países asiáticos, fico em hotel 5 estrelas, em Resorts, muitas vezes apenas pra passar o dia, porque tudo lá é muito barato. Agora, quando vou pra Europa, fico em albergues ou na casa de outras pessoas.
KS - Quanto a compatibilidade de trabalho e das viagens, como funciona?
Tadeu - Normalmente. Desde que estou aqui na universidade, tenho viajado bastante. Tenho direito a trinta dias de férias, que costumo dividir em três e, sempre que possível, emendar com feriados. Para ampliar minhas férias, sempre atuo como mesário nas eleições e compenso posteriormente. Na verdade, qualquer um que saiba se programar, pode fazer suas férias render de 30 para 40 dias. Enfim, faço todo um planejamento e nunca faltei um dia de trabalho.
KS - Planejamento, pesquisa e organização são fundamentais?
Tadeu - Isso. Tudo deve ser devidamente planejado. Não posso comprar uma passagem e viajar em duas semanas. Primeiro, tenho que falar com a chefia da universidade, verificar se no período que pretendo viajar não terá nenhum evento. Mesmo que eu encontre uma passagem bem barata para um determinado período, se tiver algum evento aqui, eu não me ausento, pois a prioridade é o meu trabalho. Mas, tudo é uma questão de organização, pesquisa e planejamento. Depende do lugar pra onde vou. Tem vezes em que viajo por uma semana, outras vezes por quinze dias.
KS - Viajar e se aventurar pelo mundo independe de idade?
Tadeu - Com certeza. Recentemente estive na Nova Zelândia, em Queenstown, um dos lugares mais bonitos do mundo e a capital mundial dos esportes radicais. Fui descer uma montanha com carrinho de rolimã. Lá encontrei crianças, idosos, frequentadores de todas as idades praticando esportes. Conheço pessoas com mais de 70 anos que viajam pelo mundo todo, apenas com uma mochila nas costas.
KS - Então, não é preciso ter dinheiro sobrando e nem esperar se aposentar pra percorrer o mundo?
Tadeu - Exato. As pessoas precisam entender que viajar é um investimento pessoal. No quanto é importante conhecer outras culturas, trocar experiências. E viajar sozinho, também é muito bom, porque a gente faz amizades mais fácil. Ou seja, quando viajamos em grupo, conversamos mais com nossos amigos, e quando estamos sozinhos nos obrigamos a interagir com outras pessoas. Principalmente em hostel (albergue), assim que você chega já faz amizade, porque todos estão na mesma sintonia. Não espere se aposentar pra começar a viajar. Se organize, planeje e comece a se aventurar pelo mundo enquanto sua saúde está boa, pois a vida passa depressa.
KS - Você conhece todos os estados brasileiros?
Tadeu - Só não conheço ainda o Norte do país.
KS - Comparado aos 36 países que você conhece, como você avalia o turismo no Brasil?
Tadeu - São culturas totalmente diferentes. O Brasil é muito rico culturalmente e os atrativos turísticos também. O problema é que o turismo no Brasil é muito caro. Por isso, assim como muitas outras pessoas, prefiro viajar para outros países.
KS - Na região das Missões tem algum atrativo turístico que você ainda não viu em outros países?
Tadeu - Sim. Já viajei por 36 países e nunca vi um lugar parecido com o Sítio das Capivaras, em São Pedro do Butiá. As capivaras são mansas e interagem com as pessoas. É incrível isso.
KS - Você concorda com o ditado popular "santo de casa não faz milagre"?
Tadeu - Concordo, infelizmente. A maioria das pessoas não dão valor para a riqueza cultural e turística de sua cidade ou região. Um exemplo é o Museu 25 de Julho, em Cerro Largo, que poucas pessoas conhecem e visitam. No local, se encontram objetos raríssimos, que remetem à imigração alemã e às reduções jesuíticas. Também eventos culturais não são prestigiados como deveriam. O mesmo ocorre com talentos locais. Quer dizer, na maioria das vezes, as pessoas só passam a dar valor quando aquele cantor, músico, atleta, ou qualquer outro segmento profissional, consegue seu espaço fora do lugar onde vive.
KS - De que forma surgiu a ideia de escrever o livro Como sobreviver no exterior?
Tadeu - Simone Póvoa e eu, resolvemos escrever o livro (disponível em vários sites na internet) depois de sermos convidados várias vezes para sentar com amigos, colegas e filhos de conhecidos para explicar sobre como é estar fora do Brasil e dar dicas de como tirar o máximo de experiência, gastando pouco dinheiro. Na época, Simone, que é natural de Brasília, já morava há quase seis anos nos Estados Unidos e eu, já tinha visitado 34 países.
KS - Fale um pouco sobre o conteúdo do livro.
Tadeu - Abordamos sobre diferentes tipos de experiências que se pode ter fora do Brasil, e como se preparar para cada uma delas. Explicamos detalhadamente sobre todas as etapas do processo de ir para o exterior, do minuto em que bate a vontade de viajar até o momento de fazer as malas pra voltar. Falamos sobre planejamento financeiro antes e durante a viagem, documentação necessária (incluindo carteira de vacinação e seguro saúde), como se comunicar com o Brasil, como superar desafios que poderão surgir, o que fazer em casos de emergência, entre outras dicas preciosas. Também dedicamos um capítulo àqueles que decidam por não voltar ao Brasil, ou que optam por ir em caráter semipermanente, para passar muitos anos fora.
KS - Para onde e quando você planeja a sua próxima viagem?
Tadeu - Meados de novembro deste ano. Ainda estou definindo o roteiro, mas provavelmente irei pra Coréia do Sul.
KS - Qual a maior lição de todas as tuas viagens?
Tadeu - Aprendi a ser feliz comigo mesmo. Aprendi a ter mais autoconfiança, mais segurança em minhas atitudes. Aprendi a economizar e não gastar com coisas supérfluas. Viajar é autoconhecimento, é superar medos. A cada viagem que faço volto renovado, leve e já determinado a planejar meu próximo roteiro. No meu entendimento, cada nova estrada que você percorrer vai te mostrar um pouco mais do que é o mundo e de quem é você. Boa viagem!