Cerro Largo, 05 de maio de 2024. Boa Noite!
[email protected] (55) 9.9982.2424
Logomarca LH Franqui
Publicado em 03/06/2023 09:38:02 • Opinião

A lição de Ulisses

Quanto mais próximo estamos da fonte de nosso vício, mais chances temos de consumi-lo

Na Odisseia, poema épico de Homero, um dos desafios que Ulisses encontra ao voltar para casa depois da guerra de Tróia é sobreviver às sirenas. As sirenas na mitologia grega são criaturas que correspondem à metade-mulher, metade-pássaro (mais tarde a cultura as transformou em sereias, metade-peixe), cujas canções encantadas atraíam marinheiros para a morte nos penhascos rochosos de ilhas próximas. A única maneira de um marinheiro passar por uma sirena era não as ouvir cantar. Ulisses ordenou que sua tripulação pusesse cera de abelha nos ouvidos e o amarrassem ao mastro do veleiro, prendendo-o ainda com mais força se ele implorasse para ser solto, ou tentasse se livrar. Esse exemplo da mitologia grega é útil para nos conscientizar da importância de criar barreiras físicas literais e/ou distância geográfica entre nós mesmos e alguma coisa que estamos tentando evitar, o que funciona especialmente para vícios e comportamentos/ hábitos tóxicos.

Se você é um chocólatra e quer comer um pouco menos de chocolate (mas só um pouco e não cortar de vez) é importante “escondê-lo” em cômodos de difícil acesso na casa, como o ponto mais alto do armário. Se você está querendo ver menos televisão, recomendo desligar a TV da tomada e guardá-la em algum cômodo distante da sala. Quer poupar dinheiro? Desinstale o pix e deixe o cartão de crédito em casa; quer parar de beber? Evite passar por bares no seu trajeto de caminhada. Quer parar de jogar videogame? Deixe o console na garagem!

Enfim, quanto mais próximo estamos da fonte de nosso vício, mais chances temos de consumi-lo, por isso manter a distância facilita o autocontrole. No entanto, o controle não deve ser baseado apenas na distância física, mas sim na força de vontade e na compreensão dos mecanismos que nos levam a buscar essas substâncias ou comportamentos viciantes. É preciso reconhecer que o vício não é apenas uma questão de proximidade física, mas também emocional e psicológica. Muitas vezes, estamos mais propensos a ceder à tentação quando nos sentimos emocionalmente fragilizados, estressados ou entediados. E as tentações são muitas!

Acontece que vivemos em um mundo abundante de possibilidade de mecanismos de fuga da realidade. Um camponês do século XV e alguma coisa quando tinha um dia ruim não tinha muito o que fazer para descontar a frustração a não ser ordenhar uma vaca mais, chutar os trigos ou ir à igreja local. Hoje temos TV, vídeos de 15 segundos, videogames, açúcar industrial, calmantes, sites chineses que vendem produtos baratos e infinitas possibilidades de prazer que nos tornam adictos. A saída para isso é a disciplina, seja pela distância ou pela força de vontade.

Para concluir, imagino que se Ulisses estivesse no século XXI ele certamente teria desafios maiores que as sirenas…

 

(*) Leonardo Stoffels é Psicólogo e atende em Cerro Largo

Fonte: Leonardo Stoffels / Psicólogo
Odisseia
Homero
Ulisses
CONTINUE LENDO
Receba nossas notícias pelo WhatsApp