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Publicado em 26/09/2023 13:10:19 • Opinião

Fofocas e meias verdades

O nosso ímpeto de espalhar fofocas é uma das perversões mais sutis que conhecemos
Imagem meramente ilustrativa (Foto: Freepik)

Não existe nada mais angustiante do que quando você tá ouvindo um conhecido te contar uma história, um boato ou fofoca e no fim o fulano diz "não conta pra ninguém"! Ouvir isso é entrar em uma encruzilhada: se você não contar, vai viver a angústia de manter o segredo para si, uma informação que vai lhe tirar o sono por um tempo indeterminado; se contar, vai ter que conviver com a ardência da vergonha de trair o seu confidente por mais um período que não pode ser estimado, quem sabe até o fim da sua vida.

O nosso ímpeto de espalhar fofocas é uma das perversões mais sutis que conhecemos. Todos a praticamos e nos negamos a mensurar o impacto que ela tem na vida de seus alvos. Quem sabe ela seja a primeira forma que conhecemos de semear a discórdia. Hoje ela tem a capacidade de fazer um estrago de proporções até internacionais, conforme o que é disseminado nas correntes de Whatsapp. E, desnecessário dizer, quase nunca é verdade. Também não é de todo mentira, toda história tem variações de uma verdade, que se multiplicam conforme o seu alcance. Dizem que a mentira tem perna curta, mas isso a gente sabe que não é verdade desde que brincávamos de telefone sem fio por cada vez que um coleguinha soprava a frase escolhida para outro acrescentando um palavrão — parece que a criança descobre a sua criatividade na hora da travessura, tal qual o adulto na hora travessa de montar a fake news.

Amenizar isso parece ser tão difícil quanto fazer um voto de silêncio, afinal quem de nós que resiste em ocultar a última mancada do vizinho? Ou mesmo em deixar de clicar naquela manchete sensacionalista que revela quantas drogas a cantora do momento experimentou antes de surtar? Esses boatos e difamações da vida alheia sustentam um mercado e chegam até nós com tanta frequência que se tornam parte da vida, como o ar que respiramos, um contágio.

Tentar averiguar uma informação antes de passá-la adiante é ainda mais complicado se levarmos em conta o impasse filosófico de que a humanidade não se sustenta sem a hipocrisia. Para entender bem o que quero dizer recomendo o filme O Primeiro Mentiroso (The Invention of Lying, disponível na Amazon Primme enquanto escrevo). Trata-se de uma comédia ácida sobre uma sociedade hipotética em que literalmente ninguém é capaz de mentir, exceto o personagem interpretado por Ricky Gervais, quando descobre ser o único humano capaz de distorcer a verdade e ter o superpoder da mentira, inventando a primeira religião. A competência do filme está nas críticas sociais que servem como um estudo de observação sobre como as pessoas funcionam e o mundo de aparências por trás de instituições como o casamento e a família. Em outras palavras, o que vemos ali nos ensina que não há como viver sem as aparências. Precisamos sempre de uma encenação para manter a ordem das coisas. Ou de uma fofoca para destruí-la!

Para concluir, deixo aqui os versos de um famoso poeta gaúcho:

"Não te abras com teu amigo
Que ele um outro amigo tem.
E o amigo do teu amigo
Possui amigos também…"
(Da Descrição, Mário Quintana)


(*) Leonardo Stoffels é Psicólogo e atende em Cerro Largo.

Fonte: Leonardo Stoffels / Psicólogo
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