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Publicado em 11/07/2022 19:04:39 • Artigos

Por que os mistérios nos deixam obcecados

A obsessão nos traz uma fantasia de controle, tornando a vida previsível

Por Leonardo Stoffels

Em meados dos anos 80, uma pessoa que hoje se identifica como Darius S. gravou uma música desconhecida de New Wave que ouviu na estação de rádio pública alemã Norddeutscher Rundfunk em uma fita cassete. Com o passar dos anos, uma pulga cresceu atrás da orelha de Darius: qual é o nome/autor dessa canção misteriosa? Em 2007, através de sua irmã, a dúvida de Darius chegou até os fóruns da internet, bem como mais tarde uma gravação em áudio da canção. E a pergunta permanece sem resposta: passados 15 anos, ninguém conhece a origem por trás da "canção mais misteriosa da internet" (The Most Mysterious Song on the Internet), como é conhecida a lenda, mesmo que a história tenha ganhado uma matéria na Rolling Stone e que grandes radialistas da Alemanha tenham sido consultados a respeito da música. Darius, a irmã e milhares de internautas permanecem obcecados em descobrir quem fez essa canção.

Falando em obsessão, um de meus filmes favoritos é As Virgens Suicidas (um abraço para a minha amiga Letícia, se estiver lendo esse texto, ela também é fã do filme). Na história um grupo de amigos, já adultos, narram o período da adolescência em que conviveram com cinco irmãs misteriosas que cometeram suicídio. Passados muitos anos do ocorrido, os amigos permanecem apaixonados por aquelas garotas, coletando pertences que conseguiram encontrar, depoimentos e afins de pessoas que conviveram com as mesmas. Para eles o mistério daquelas garotas torna-se a grande obsessão de suas vidas, descobrir quem elas de fato eram e por que razão tiraram suas vidas.

O nosso cérebro tem muita dificuldade de lidar com o desconhecido, por isso estamos sempre procurando padrões mesmo em coisas que não existem. Procurar razão onde não há é uma maneira de termos controle sobre aquilo que é escuro para nós. Aliás, temos medo do escuro justamente por ele ser desconhecido. Mas o ser humano é muito ambivalente, nossos medos também podem se tornar desejos em algumas circunstâncias, por isso filmes de terror nos fascinam, mesmo quando assustam. E o fascínio dá lugar à obsessão.

A obsessão nos traz uma fantasia de controle, tornando a vida previsível. É como se o objeto da obsessão fosse aquela parte que falta para nos tornarmos felizes. Quando se está obcecado, o mundo parece um lugar mais simples, onde as regras já estão dadas e o caminho está definido. Darius e sua irmã talvez acreditem que descobrir o autor da canção misteriosa fará com que suas vidas fiquem completas, assim como os amigos do filme acreditam que entender o mistério das irmãs os tornaria livres. E será que tornaria mesmo?

Freud diz que o ser humano é um sujeito clivado, que é dividido entre a adesão à própria sujeição e a revolta a ela. Ou seja, odiamos sermos dependentes de algo ou alguém, mas temos muita dificuldade em nos permitir abrir mão do que nos controla. Sendo assim, queremos resolver todos os mistérios que nos cercam, mas odiaríamos viver sem o prazer de saber que eles existem.

Caso tenha ficado curioso a respeito da música é só pesquisar The Most Mysterious Song on the Internet no YouTube. É uma bela canção, obscura nos moldes de Joy Division e New Order, Echo & The Bunnymen.

Mas tome cuidado para não ficar obcecado…

Fonte: Leonardo Stoffels / Psicólogo
The Most Mysterious Song on the Internet
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